Gamificação se tornou uma palavra “da moda” há dez, quinze anos. Foi uma febre. Todo mundo queria “gamificar” tudo, até cadastro em e-commerce. Claro que a coisa não é bem por aí.
Transformar a experiência do usuário em algo divertido, onde ele tenha uma sensação de recompensa após cumprir uma função, tarefa, consumir um produto ou serviço, é sempre interessante. Os programas de milhagem, de certa forma, se apoiam nessa condição até certa parte. Afinal, quem não curte receber 100.000 estalecas voadoras que você pode trocar por uma sacola de Balas Juquinha.
O tal engajamento de marca
Uma das ações mais comuns, mas pouco exploradas, são eventos interativos em que há uma “vivência de marca” Esse buzz cobre quase tudo: de retiros em hotéis luxuosos até voos de balão. Mas isso não é gamificação.
Bom exemplo de métodos gamificados com vivência de marca é o uso de escape rooms para levar os visitantes (normalmente influencers ou decision makers) para viver o tema de um filme, série, produto por algumas horas. Com isso, o reforço de marca ou da propriedade intelectual (as IPs). Mesmo não gerando recompensa material, o impacto de uma experiência imersiva desse quilate não tem preço. É mais memorável que um mimo.
Outro exemplo levantado por Martin Langstron, em Buyology, é o quanto uma mensagem é melhor absorvida pelo cliente/consumidor/influenciador quando a vivência de consumo de uma marca transcende o próprio produto. Esse impacto foi bem descrito no estudo de J.U. Islam, “sensações, sentimentos, cognições e respostas comportamentais de um cliente são provocadas por estímulos relacionados à marca que fazem parte do design e sua identidade, embalagem, comunicações e ambientes”.
Sabemos que isso ficou meio “cabeçudo”. É que queremos deixar claro que a coisa não é só um achismo de nossa parte. A boa experiência de uma marca, produto ou serviço gera marcas profundas em quem participa de um evento desse tipo.
E, quem sabe, viram campeões da marca, né?
A Educação Lúdica
Esse é um tema que adoramos atuar, e sempre temos a preocupação em deixar claro que o tal “jogo educativo” pode fazer tudo, menos substituir uma aula dada por um professor. Assim como um reforço de marca, os jogos entram para gerar uma ponte afetiva para fixar melhor os conteúdos, ideias e conceitos através do aprendizado ativo, ou seja, aprender por meio da interação direta com o conteúdo e ações ativas.
Os alunos e professores já usam atividades lúdicas desde os primeiros anos na escola. Brincadeiras com instrumentos musicais, desenhos e colagens para temas propostos em sala de aula e outras brincadeiras enriquecem e começam a fundamentar esse vínculo de emoção para conteúdo. Esses jogos em sala de aula estão mais que enraizados nas metodologias de ensino dos primeiros anos do ensino fundamental. Então por que não expandir para os outros anos, usando modelos análogos?
Uma estratégia usada é conhecer o que os jovens já usam no seu dia-a-dia. Sejam jogos de celular, de tabuleiro, RPGs e outras atividades interativas e experimentem a aderência na hora de migrar para dentro da sala de aula.
Outro ponto de atenção é a necessidade de se embarcar em uma onda sem pensar nos benefícios pedagógicos reais. É muito legal ter um jogo de celular desenvolvido e promovido por uma escola para reforçar o ensino de futebol (sim, isto já foi feito!), mas nunca foi divulgado publicamente o quanto de adesão esse jogo teve com os alunos (já revelo o resultado: foi baixíssima! Este blogue testemunhou a operação).
Nos anos 1990, houve uma alta procura para se implementar sessões de RPG em salas de aula. Com melhores resultados, gerou uma demanda por publicações (ou suplementos de jogos) focados em temas históricos que tiveram uma boa saída. Em meados dos anos 2000–2010 surgiu um aumento no interesse do uso da ludologia no campo escolar, por meio de atividades e jogos (tanto digitais quanto de tabuleiro e cartas) desenvolvidos especialmente para desenvolver as competências e habilidades necessárias em um ambiente mais descontraído e propício ao aprendizado ativo.
Treinamentos corporativos
É quase lenda corporativa que os treinamentos costumam ser chatos, cansativos e longos demais. Porém, temos que entender que muitas vezes é verdade. Várias empresas usam dinâmicas para preparar os funcionários para situações de trabalho e conseguem fazê-lo com diversos níveis de sucesso. O que se observa é que esses resultados estão mais ligados ao que se treina, do que o como.
Claro que quebrar a dureza de uma sequência de palestras ou de intermináveis exibições de slides é sempre interessante, mas as atividades em grupo podem se tornar constrangedoras dependendo do assunto a ser tratado. Questões de relacionamento interpessoal, de higiene ou mesmo de dress code, funcionam melhor com abstrações do que com atividades interativas.
Jogos de tabuleiro, de cartas e afins são ótimas formas de colocar o participante em um ambiente seguro, onde, por meio de simulações, interações e a combinação entre competitividade e cooperação, tendem a tirar a camada de “vergonha” e leva os questionamentos desejados a outro nível de relação com as questões apresentadas.
Jogos com alta interação ou atividades de grupo, funcionam bem melhor em outras atividades, como onboardings e treinamentos de vendas, ou ainda para atendimento a clientes. Essas atividades podem ser gamificadas em si ou ainda utilizar jogos como reforço combinando-os com palestras e atividades em grupo.
Novamente, mais que o desejo de gamificar uma atividade, vale a pena pensar quais atividades se beneficiariam disso e em que momento e de que forma vale a pena fazê-lo. Neste momento, saímos de uma utilização “mecânica” da gamificação e passa-se a aproveitar melhor o potencial dessa ferramenta poderosa.